MARTE
EM CAPRICÓRNIO
A
velocidade do carro, a velocidade dos movimentos, a cidade e suas
torres, o calor invadia o desejo de ventura e percorrer as avenidas,
ruas que fazem parte da minha memória, fotografias velozes
expostas sem cadeados e nudez.
Fragmentos
colados, o carro corria, as palavras desfilando diante dos olhos,
estranha sensação de viver o instante seguinte com alegria
incontida. Atravessava ruas, avenidas estava colado a todos os
sentimentos, ficava para trás outra frase sem poder completar ,
ficava para trás, um pouco de mim.
A
exuberante claridade, as torres urbanas, os olhares fixos nos
semáforos, silêncio dentro do veículo, apenas o desejo de
continuar a frente.
Procurava
nas expressões dos olhares a transparência das emoções, e de
repente fosse revelado a razão de nossa irmandade, pensamento
inútil, ingenuidade cretina, morrendo rapidamente debaixo dos pneus.
As
sombras evaporavam rapidamente diante do esplendor solar, a boca
seca, estava faminto por escrever outra frase, que escapava sem ao
menos conseguir ser rascunho, sem um pedaço de papel, sem caneta,
movimento sem fim na memória, repassava lembranças há muito
guardadas. Gostaria de poder escrever, segurar aquele instante,
entretanto, tudo escorria como enchente que engole o que vier pela
frente e perde-se depois.
O
carro atravessa a cidade, percorre meu silêncio, sentimentos
incertos, lembranças pálidas, emoções fragmentadas. As mudanças
vividas expondo minhas cicatrizes, tantas portas por sair e entrar,
sempre seguir e às vezes não olhar para trás. Os reflexos urbanos
modelando os sentidos, colorindo cenário impermeável que ficara
trancado em minhas entranhas. Indomável desejo de ir, lançar-me, a
velocidade do carro, a velocidade das imagens, as árvores nas
calçadas, expõem seu vigor essencial escandalosamente.
O
planeta ruge ferido, mudanças radicais de temperatura, a vida
colocada em perigo, nossa auto-extinção, os senhores do poder em
suntuosa posição lavam as mãos em nome do lucro, enquanto o
planeta e´violentado pela intervenção do capitalismo , novos
Pilatos assistem de seus templos o planeta ferido expelir
dramaticamente suas chagas em brasa, rebelando-se, nossa mãe Gaia...
Meus
sentidos em pedaços, minha ira, a vida silenciosamente devorando a
vida, até o dia que a morte nos separe. Afinal onde estará o verbo
? O inicio e o fim ? Uma serpente de duas cabeças devorando-se a si
mesma, num movimento continuo sem cessar ? Será essa a eternidade ?
O
carro agora corre muito, avenidas largas e vazias, busco identificar
motivos, conclusões, mas tudo e´incompleto, fragmentos voando na
tela do pensamento, o calor do ambiente seduz como pétalas a pele.
Tudo vai desfilando rapidamente diante dos olhos. As mãos procuram
um teclado, lápis, ou caneta, traduzir o verbo que consome meu
instante-já, que amadurece rápido e logo apodrece, desaparece da
tela do pensamento. O carro continua correndo....
Uma
brisa livre bate no rosto, as luzes de mercúrio acessas, sem a noção
das horas a cidade vai desfilando diante dos meus olhos. O sabor da
liberdade sempre entorpece, mas e´volúvel e depois fica apenas o
amargo na boca e os desencontros pelas ruas da cidade.