segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

AMAR

A tarde seca abarcava de azul os olhos, a claridade e esplendor solar reverberavam de maneira pungente nos telhados e vidraças. Emoção escancarada espalha-se no ar, a cidade tremeluz diante do olhar, movimento incansável de veículos, reflexos, marcha de pedestres atravessando avenidas, faróis, olhares apreensivos cruzando-se, o pulsar incessante de sensações e sons circulam na geografia urbana.
Na Júlio Prestes a multidão espera silenciosa e exausta o trem abrir as portas, logo os vagões lotam e o trem sai lentamente em direção ao subúrbio, Ezequiel cansado agarra-se próximo a porta enquanto o vagão vai lotando de estação a estação. Corpos cansados, suados, predominando no ar amarrotado silencio. O desejo de num piscar de olhos estar em casa envolve o pensamento de Ezequiel, naquele instante o seu maior anseio. O imponderável nesse exato momento acontece, o trem para sem energia elétrica. Apagão, e as vaias e assobios, enchem os ouvidos.
Aborrecimento, cansaço, o trem parado faz quarenta minutos, ter que pegar mais uma condução depois é de deixar qualquer um estressado. Ezequiel acaba
por cochilar, de repente o trem recomeça sua marcha. Afinal ! uma brisa refrescante no rosto depois do apagão abafado é um conforto para todos, as janelas abertas vão desnudando a paisagem desgastada e mal iluminada do subúrbio.
Movimento férreo e exaustão, chegar tarde em casa, Ezequiel nem mais fica indignado, uma vez participou com a turba de um quebra-quebra de vagões pancadaria, pedradas, bomba de gás lacrimogêneo, por sorte escapou de ser preso. Perdeu o emprego por atraso na ocasião, não aceitaram justificativas, demissão sumária.
Finalmente chega em Osasco ! Sai do vagão praticamente expelido pela turba ansiosa. Finalmente é sexta-feira ! Ezequiel poderá dormir até as tantas horas do sábado. No largo de Osasco resolve ir até a Esquina do peixe, seu ânimo renova-se, sobe a Antônio Agú aliviado, depois do arrocho no trem. Chega e vai pedindo uma porção e uma cerveja bem gelada. Movimento intenso de carros e ônibus pela avenida dos Autonomistas, enquanto seus olhos não perdem de vista as garotas que passam de minissaia e blusa colada ao corpo.
Bebe com sede a cerveja provando a iguaria marítima crocante e saborosa. Sem mais nem menos uma morena sentada a sua esquerda começa a dar sinais, Ezequiel levanta e vai até sua mesa, puxa conversa, logo começam a se entender. Atraente, mulher madura, extrovertida, Míriam, quer companhia, curtir a noite, afogar suas carências e sentir o abraço forte de um homem, depois de uma semana de muito trabalho.
Ezequiel esquece o cansaço fica empolgado com o repentino encontro. Míriam conversa animadamente, olhar cativante, cabelos compridos negros, lábios finos, corpo atraente e perfume delicado. Ezequiel parece não acreditar no acaso, a sorte de estar com aquela mulher envolvente, ao fundo ouvia-se Benito de Paula emoldurando cenário perfeito, para uma noite de amor.
As horas passam os olhares tornam-se mais brilhantes, o efeito etílico os envolve aguçando o desejo então levantam-se e juntos vão para a casa de Míriam descendo a rua Antônio Agú em direção a rua Pedro Fioretti. Sem questionar ou
temer adentram na casa, logo na sala beijam-se sedentos, trocando abraços, despindo-se. Ezequiel procura o chuveiro e juntos banham-se. Bocas coladas, corpos nus, molhados em frenesi. Boca e língua de Ezequiel buscam os fartos seios, o ventre sedoso, o sexo em brasa de Míriam.
Madrugada a dentro repete-se várias vezes luta corporal, ritmo e movimento, Lábios sedentos, corpos que se entrelaçam em busca do extremo prazer. Sussurros, sons, numa cegueira em chamas. Duas vidas entrelaçadas, num encontro inesperado, sem prévio conhecimento, sem antecedentes. Vidas consumidas pela angustia de viverem solitariamente, então devoram-se até a claridade do dia iluminar os corpos abraçados nos lençóis.
Acordam ao mesmo tempo, próximo ao meio-dia, e foi a partir daquele instante e noite anterior que perceberam a cumplicidade de suas vidas, eles mereciam uma oportunidade em busca da felicidade, a volúpia selvagem que os envolveu, o entorpecimento sexual marcou profundamente suas existências e não haveria razão para continuar vivendo sós, por que não tentar viver juntos e esquecer os anos de solidão e amarguras, desgastados em perambular pelos bares a noite e mendigar amor. Trocaram confidencias comuns, começaram a conversar e reconhecerem-se iguais, retratos em preto e branco, vidas anonimas diluídas na angustia, encontros, desencantos, sobressaindo em comum a solidão e assim conversando o sábado foi consumido. Assim outros dias vieram, e assim Ezequiel e Míriam permaneceram juntos...
07/10/2011


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