quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

SOB O OLHAR DE NÊMESIS

Estávamos em setembro, estávamos perplexos, não houve primavera, nenhuma floração, predominavam dias frios de um azul avermelhado cintilante. Sentimento de estranheza no ar. Na rua as pessoas entreolhavam-se e quase diziam umas as outras: “Você percebeu que alguma coisa esta estranha ?”
Pardais, bem-te-vis, qualquer pássaro, voava emudecido pelas antenas e quintais, um silencio estarrecedor começou a incomodar, inquietação silenciosa que perturbava a todos, encontraram um argumento para explicar o fenômeno, a inversão magnética dos polos. Certa noite, nota-se a olho nu no firmamento um grande astro brilhando intensamente, emitindo cor roxa azulada assustando os curiosos. Seria o sinal do final dos tempos ? Sem mais nem menos, todas as igrejas, de variados credos, começaram a ter lotação completa todos os dias. Até mesmo os mais antigos sacerdotes, começaram a expor publicamente seus temores, sua perplexidade diante das mudanças inexplicáveis, o medo coletivo das pessoas, a ineficiente solução escatológica não correspondia ao anseio popular. Cientistas, profetas do apocalipse eram procurados pela mídia para explicar as mudanças na natureza em todos os continentes.
Um emaranhado de teorias, explicações cientificas, metafisicas pululavam
nos jornais, por todos os meios de comunicações, mapas enviados por satélites,
analises que mudavam a cada dia sem explicar a repentina alta das mares devastando cidades litorâneas, invernos rigorosos em regiões semiáridas, a morte de todas as especies de abelhas, pragas de insetos surgindo do nada devorando tudo, a mudança de comportamento dos animais domésticos, dos últimos animais que restavam nas reservas florestais. Os rios amazônicos começam a secar repentinamente, assim como todos os grandes rios espalhados pelos continentes, os períodos de estiagem prolongam-se, o processo de desertificação acelera-se, a água potável torna-se produto muito valorizado, motivo de disputas e conflitos bélicos. Banqueiros, o cartel internacional da droga, o vaticano, a maçonaria, seitas diversas, comunidade científica, líderes mundiais, grupos transnacionais, uniram-se secretamente e investiram volumosas somas de dinheiro para a salvação mundial, inócua busca para o desespero da burguesia. As nações ricas aceleram pesquisa e produção de tablete alimentar, ração humana, aproveitando lixo domestico, mas o que fica oculto da grande massa, e´ a reciclagem de proteína a partir de cadáveres, dando ao tablete alimentar porcentagem ideal de alimentação diária, condição para sobrevivência e tentativa de controle social. O atendimento psiquiátrico triplicou, surtos paranoicos agressivos, parecendo pandemia a varrer as cidades. A situação começou a ficar fora do controle, quando as colheitas de alimentos foi afetada principalmente nos países ricos os primeiros a sentir dramática mudança. Reuniões de cúpulas foram agendadas com urgência na sede das nações, o estado de sítio foi imposto, os exércitos saíram para as ruas para patrulhar a turba, prender e atirar em qualquer um que tentasse pilhar lojas, bancos, supermercados, até começarem a distribuir os alimentos racionados, posteriormente a ração humana. A economia mundial entrou em parafuso. A agricultura parou de produzir pois o solo estava esgotado e a agressiva radiação solar consumia as plantas e a exposição dos campesinos a luz acelerava rapidamente o sarcoma de pele. Quase não haviam peixes, algas marinhas, recifes, nos oceanos, enormes embarcações de lixo contaminavam os mares, as baleias estavam extintas, pequenos cardumes agonizavam por oxigênio. O planeta parecia rugir como animal acuado e ferido !
Então volumosas explosões solares começaram a afetar todas as transmissões, rádio, televisão, telefonia tudo parou de repente. O pânico toma conta das ruas das grandes cidades, incêndios, pilhagem, as tropas policiais rebelam-se e a partir daí a degeneração social acelera-se rumo a barbárie. Os ricos montaram nas suas propriedades castelos bélicos, armados até os dentes para defender alimento e
água potável, enquanto a massa miserável formava grupos de guerrilha para assaltar o pouco alimento natural que restava que era semeado e colhido em terras restritas, não contaminadas protegidas por estufas, inacessíveis, vigiadas para alimentar os ricos e sua descendência, aqueles que ainda tinham dinheiro compravam no mercado negro. O mercado negro proporcionou privilégios a pequeno grupo comercial, que manipulava a economia e o poder politico centralizado, enquanto a maioria agonizava diante da fome. O suicídio tornou-se a via mais fácil para fugir do desespero, do que restava da vida, procurava-se desesperadamente frascos com o elixir da esperança. A violência, a lei do mais forte corria por todos os lados, não havia mais valores morais, os compêndios jurídicos eram usados para acender fogueiras nas noites frias. A instituição do Estado desaparecera, a barbárie predominava finalmente, truculência, execuções sumarias, doenças contagiosas ceifavam vidas, canibalismo, violações, a vida humana estava movida pela impunidade, instinto de sobrevivência. A esperança jazia dentro de cada ser humano. Milhões de mortos, a humanidade dizimada agonizava vivendo o umbral semeado por ela mesma.
Sentia o suor escorrer no rosto, estava desesperado, corria tentando fugir, sair daqueles becos escuros e fedorentos, gritos de ódio, de horror, ensurdeciam os ouvidos, tristes figuras transtornadas vagavam como espectros pelas ruas no cenário dantesco.
Cansado, sentia muita sede, olhava a cidade destruída, queimada, tirava de dentro de mim toda a energia e corria sem direção certa pois a sombra da morte reinava soberana e não mais haveria dias de primavera para recordar, quando estava prestes a cair numa enorme vala de corpos, num salto de profundo desespero acordei bruscamente com a respiração ofegante, tremulo e olhos lagrimejantes....
21/10/2011


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