DESCONECTADO
EM SP
Enquanto
a tarde crepitava debaixo do sol, os olhos despiam ruas, avenidas,
vitrines, bares lotados, edifícios, corpos suados, carros velozes
cruzavam os labirintos da cidade, vibrando no ar cores, sons,
odores, sensualidade e calor.
O
suor escorria no rosto, camisa entreaberta, barba por fazer,
caminhava pela calçada admirando a luminosidade tentando decifrar os
sentimentos das faces anonimas que passavam ao redor. Os olhos
percorriam o cenário urbano colecionando as expressões faciais
dos pedestres.
Naquela
tarde ele queria apenas perambular pelas ruas do centro velho, andar
pela rua Direita, Galeria Olido, Praça do Patriarca, XV de
novembro, Boa Vista, Ladeira Porto Geral, Largo de São Bento,
Viaduto do Chá, Líbero Badaró, passar pela avenida Ipiranga,
praça da República, talvez tomar um chopis no bar Guanabara,
comer um bauru no Ponto Chic, yakisoba na Liberdade ou baião de dois
no Bexiga, sem itinerário certo deixando o tempo passar, olhar,
paquerar a
morena,
a loirinha, a japonesa, a mulata... até cansar-se e retornar,
voltar para casa. Ao contrário da maioria admira os prédios
antigos sua predileção é ficar olhando como um fotografo detalhes
que passam desapercebidos, curvas , semi-retas, ângulos, estilos, o
efeito da luz ... imaginando como deveria ter sido a vida na São
Paulo antiga, assistir filmes de época em preto e branco sua
predileção.
Luzes
acesas, a tarde vai chegando ao fim, faróis inclementes, um
sentimento oco dentro do peito, vento frio varre as ruas, as
lembranças carcomidas. Continua com seu andar distraído sem
pensamentos pré-concebidos, identificando sensações, que o
confortam ou negligenciam. O sol alaranjado rapidamente vai
escorregando na linha do horizonte, desaparecendo entre os prédios,
carros, na solidão dos pensamentos. Anda sem pressa, levanta a gola
da camisa abotoa o bleizer, protegendo-se da brisa fria. Distraído,
não preocupa-se em procurar os ponteiros de um relógio, escuta os
próprios passos, a respiração, atravessa as ruas imaginando a
sequencia dos minutos no cotidiano das pessoas ao seu redor.
Os
faróis ferem os olhos, desnudando ansiedade, angustia, solidão
dos transeuntes. Um mar de carros, ônibus, vão congestionando as
principais vias da cidade, buzinas, sirenes. Uma mistura de
sentimentos embaralham-se acomodando sentimentos difusos, nostalgia
sem explicação, imagem sobrepondo imagem, refletindo no brilho dos
seus olhos, enquanto a noite encobre de vez com seu manto os
edifícios, então muda de direção e vai para a estação
Anhangabaú do metrô. Quando o vagão chega, abre as portas, as
pessoas na plataforma entram e logo começa a andar. Ao sentar-se no
banco do vagão dá conta que passou o dia inteiro desconhecendo
as manchetes dos jornais, não preocupou-se com telefones
deixando-se levar pelo acaso, o que lhe proporcionou alivio e um
breve sorriso de desdem desejando que não houvesse a próxima
estação para descer, não houvesse ponteiros para aprisionar o
tempo, agendas, documentos para guardar, rotular comportamentos,
objetos, pessoas, sentimentos, classe social...pegou a caneta
escreveu o simbolo do infinito na mão e soltou gostosa gargalhada,
ninguém no vagão entendeu nada...
30/03/2012
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